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⚔️ júri suspenso por falha grave na defesa
confira a primeira edição da tribuna do leitor

Bom dia, criminalistas!
Boas-vindas aos novos assinantes que se inscreveram na última semana. Agora, somos 5.049 leitores na maior newsletter de direito penal do Brasil. A frase da edição é: A liberdade não é um luxo dos tempos de bonança; é, sobretudo, o maior elemento de estabilidade das instituições. - Rui Barbosa.
O mapa 🗺️ da edição de hoje
caso lázaro ainda não acabou
algema não é figurino de júri
the penal code da semana
silêncio da defesa falou alto
tribuna do leitor
01 | caso lázaro: MP aponta falhas e Justiça autoriza novas diligências
O inquérito sobre a morte de Lázaro Barbosa (jun/2021), morto após 20 dias de buscas em Goiás/DF, ganhou novo fôlego.
A Justiça atendeu pedido do Ministério Público de Goiás para realizar novas diligências a fim de suprir lacunas em laudos e atos periciais acerca da atuação policial na captura. Parte da imprensa noticiou a medida como “reabertura do inquérito”.
O MP, porém, esclareceu que o procedimento nunca foi encerrado formalmente e segue em curso com complemento de provas.
Pontos a apurar incluem laudo cadavérico definitivo, necropapiloscópico e confronto microbalístico das armas empregadas na operação, além de oitivas complementares de agentes.

A linha é verificar materialidade e dinâmica do confronto sob padrões de cadeia de custódia.
Em relatos de 2021, peritos indicaram dezenas de disparos e múltiplos projéteis no corpo, o que reforça a necessidade de reconstrução precisa da cena.
Em termos institucionais, o movimento se ancora no dever de controle externo da atividade policial e na possibilidade de novas diligências quando as provas são insuficientes — especialmente em casos de alta letalidade policial e grande repercussão social.
A medida busca padronizar os autos para eventual conclusão do MP, seja por arquivamento fundamentado, seja por responsabilização.
🧐 O que é preciso saber?
Novas diligências: mesmo após relatório policial, a autoridade pode requerer complementações quando necessárias (art. 18, CPP).
Cadeia de custódia: vestígios balísticos/biológicos devem seguir os arts. 158-A a 158-F, CPP (coleta, preservação, rastreabilidade).
Controle externo: atuação do MP para fiscalizar a investigação policial (art. 129, VII, CF), com pedidos de laudos e oitivas adicionais.
Transparência x sigilo: publicidade dos atos deve ceder ao sigilo investigativo quando necessário à efetividade da apuração (art. 20, CPP).

02 | réu no júri: algemas, roupas e postura
O STJ consolidou balizas práticas sobre como o acusado deve ser apresentado ao Conselho de Sentença, tema sensível porque símbolos influenciam jurados leigos.
Em síntese: algemas só com justificativa concreta (risco real de fuga ou à segurança); mantê-las por “falta de efetivo” anula o julgamento, à luz da presunção de inocência e da SV 11 do STF (caso AREsp 1.053.049). No precedente, a Sexta Turma determinou novo júri sem algemas, salvo motivo idôneo.
A Quinta Turma também reconheceu nulidade quando o réu permaneceu de costas para os jurados: é indispensável contato visual, por respeito à presunção de inocência e à dignidade do acusado (AgRg no HC 768.422).

Quanto às roupas, não se pode obrigar o uso de uniforme de presídio: o réu tem direito a trajar roupas civis, pois a aparência carcerária estigmatiza e pode contaminar a percepção dos jurados (HC 778.503). O acórdão ainda cita as Regras de Mandela como parâmetro de dignidade.
Sobre silêncio do acusado, a mera referência, sem exploração para influenciar o veredicto, não gera nulidade; já a utilização pejorativa em plenário viola o art. 478, II, do CPP (AREsp 2.773.066).
Em cenários de altíssima periculosidade, o interrogatório por videoconferência é legítimo, desde que necessário e garantidas defesa e comunicação privada (RHC 181.653; art. 185, §2º, CPP).
✍🏻 Entendendo melhor…
Algemas: nulidade se usadas sem razão concreta; SV 11/STF e AREsp 1.053.049 (STJ).
Posicionamento em plenário: réu de frente aos jurados; anulação se de costas (AgRg no HC 768.422).
Roupas civis: vedada imposição genérica de uniforme prisional; dignidade e imparcialidade (HC 778.503).
Silêncio do acusado: menção neutra não anula; vedada exploração contra o réu (AREsp 2.773.066; art. 478, II, CPP).
Videoconferência: possível em casos excepcionais, com garantias integrais (RHC 181.653; art. 185, §2º, CPP).

1️⃣ Faça um checklist do plenário: SV 11, pedido de roupas civis, assento voltado ao Conselho, registro em ata de qualquer negativa.
2️⃣ Monte um roteiro de nulidades: quando pedir, como demonstrar prejuízo e quais precedentes citar (AREsp 1.053.049; AgRg no HC 768.422; HC 778.503).
3️⃣ Treine incidente prático: promotor alude ao silêncio — diferencie referência neutra (admissível) de exploração indevida (nulidade).
4️⃣ Elabore minuta de petição pré-júri com pedidos cumulados (roupa civil, sem algemas, logística de segurança, posição no plenário, gravação integral).

O código penal do dia…
O Direito, por si só, não é suficiente para formar um profissional completo. O mundo mudou, e o mercado exige muito mais do que conhecer leis e jurisprudências. Hoje, o profissional que se destaca é aquele que entende de pessoas, negócios, tecnologia e comunicação.
Estudar outras áreas amplia a visão estratégica e ajuda o profissional a entregar soluções mais eficazes, criativas e adaptadas à realidade.
Ao sair da faculdade, todos partem de um mesmo nível, com bom conhecimento técnico jurídico. Contudo, isso representa o mediano, pois aquilo que todos dominam estabelece a média dos profissionais.
Ao buscar conhecimento fora do Direito, formam-se profissionais únicos, com saberes diferenciados que proporcionam avanço em relação aos que permanecem nivelados pela média.
Um profissional que domina apenas o Direito tende a oferecer respostas técnicas, enquanto aquele que compreende o funcionamento do mundo empresarial, o comportamento humano e as transformações digitais entrega resultados.
O conhecimento multidisciplinar torna o raciocínio mais crítico, aprimora a tomada de decisão e fortalece a capacidade de inovação.
Em um cenário cada vez mais competitivo, entender de gestão, marketing e finanças é tão importante quanto conhecer o Código Civil.
4 áreas que todo profissional do Direito deveria estudar:
1. Gestão e Empreendedorismo: para estruturar o escritório e entender o cliente como empresa.
2. Finanças e Contabilidade: para falar a língua dos negócios.
3. Comunicação e Marketing: para construir autoridade e conectar-se com o público.
4. Tecnologia e Inovação: para usar dados e automação a favor da eficiência.

03 | júri dissolvido por atuação insuficiente da defesa
O julgamento dos tios de Márcio dos Anjos Jaques (menino de 1 ano e 11 meses morto em 2020) foi interrompido em Alegrete (RS).
O juiz Rafael Echevarria Borba dissolveu o Conselho de Sentença ao entender que os réus estavam indefesos diante da atuação considerada insuficiente da defesa técnica.
A sessão foi suspensa e novo júri será marcado, com orientação para que os acusados constituam novos patronos.
Segundo a cobertura local, a decisão levou em conta a plenitude de defesa no Tribunal do Júri, padrão reforçado quando há sinais objetivos de desequilíbrio na paridade de armas em plenário.
O caso integra a série de sessões do júri do processo, cujo histórico é acompanhado pelo TJRS.

Do ponto de vista jurídico, a medida dialoga com a jurisprudência que distingue “falta de defesa” (nulidade absoluta) de “defesa deficiente” (nulidade relativa, exige demonstração de prejuízo), nos termos da Súmula 523 do STF, orientação frequentemente aplicada pelo STJ em controle de nulidades do Júri.
Quando a insuficiência é tão grave a ponto de comprometer a plenitude de defesa, o magistrado pode agir para preservar a lisura do julgamento.
🌊 Mergulhe no tema…
Base legal do Júri: competência (art. 5º, XXXVIII, CF) e rito dos arts. 406–497, CPP; em plenário, vigora a plenitude de defesa.
Nulidades: Súmula 523/STF, falta de defesa = nulidade absoluta; deficiência = nulidade relativa, com prova do prejuízo; aplicada em precedentes do STJ.
Poder-dever do juiz: diante de prejuízo manifesto à defesa em plenário, é possível dissolver o júri e redesignar julgamento, para assegurar paridade e regularidade do ato.
Para quem estuda, o recado é direto: plenário do Júri não é “apenas” contraditório amplo; é plenitude — e isso tem consequências práticas quando a atuação defensiva fica aquém do mínimo. 🙂

1️⃣ hecklist do plenário: tempo de fala, estratégia mínima, requerimentos essenciais (testemunhas, quesitos, ordem dos debates) e registro de protestos em ata.
2️⃣ Quadro comparativo: “falta de defesa” × “defesa deficiente” → espécie de nulidade, ônus de demonstração e efeitos na apelação (art. 593, III, CPP).
3️⃣ Peça prática: modelo de arguição de nulidade por prejuízo concreto (ex.: uso ínfimo do tempo, ausência de tese, falhas na réplica), com pedido subsidiário de novo julgamento.
4️⃣ Estudo de caso: acompanhe o histórico do processo no TJRS para consolidar cronologia e fundamentos da decisão que dissolveu o júri.


Assinatura do Leitor
"Legados da Ditadura: Violência Institucional"
A transição política não resultou em uma reforma profunda das instituições de segurança, permitindo que as práticas abusivas e a mentalidade autoritária da ditadura militar sobrevivessem sob nova roupagem. A violência institucional não é apenas um resquício, mas um sistema que reproduz ativamente as violações do passado.
O principal motor dessa continuidade é o Racismo Estrutural. Os alvos históricos — jovens, negros e pobres — continuam a ser o foco da repressão estatal. Isso se manifesta na letalidade policial desproporcional (83,1% das vítimas em 2022 eram negras) e na prática do Perfilamento Racial nas abordagens, que funciona como um filtro seletivo para o encarceramento em massa.
O sistema prisional reflete essa seletividade, operando com superlotação e degradação, onde a ausência de garantias na execução penal se configura como um legado da ditadura. É crucial que a comunidade jurídica debata esses legados autoritários para desmantelar as estruturas que permitem a persistência e o aprofundamento da violência institucional na sociedade democrática.
No artigo "Do Navio Negreiro ao Camburão: Uma análise da violência policial no Estado de São Paulo contra a população negra", atualmente no prelo pela Revista História em Reflexão, promovo uma análise do perfilamento racial em abordagens policiais, a partir da discussão do Habeas Corpus nº 208.240. Este trabalho dialoga diretamente com outro artigo, intitulado, "Menores e o Estado Repressor: Violência institucional e a luta por direitos no Brasil dos anos 1980", publicado na Revista Cordis, em agosto de 2025, que examina como a violência estatal se manifestou contra crianças e adolescentes nos anos finais da ditadura e a importância da resistência civil para a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Sobre o tema de Violência de Estado, também organizei o livro "Democracia, Direitos Humanos e Violência de Estado", publicado pela Editora EDUC, em 2019, e disponível em acesso livre, que reúne diversas contribuições sobre o tema central da violência de Estado na história contemporânea.
Luiz Antonio Dias
Pós-doutor em Direito, Economia e História pela Universidad Nacional de Córdoba (2015), doutorado (2000) e mestrado (1993) em História pela UNESP. Especialização em Direito Penal e Processo Penal pela Escola Brasileira de Direito. Bacharel em Direito, licenciado em História. Professor na Faculdade de Ciências Sociais e no Programa de Pós-Graduação em História da PUC-SP. Membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP.

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