🛩️ calendário penal não carimba passaporte

e incidente de insanidade pode definir desfecho

Bom dia, criminalistas!

Boas-vindas aos novos assinantes que se inscreveram na última semana. Agora, somos 5.047 leitores na maior newsletter de direito penal do Brasil. A frase da edição é: é melhor correr o risco de salvar um homem culpado do que condenar um inocente. - Voltaire

O mapa 🗺️ da edição de hoje

  • poluição virou crime de intenção

  • reencarnação não livra da lei

  • the penal code da semana

  • extradição não trava o tempo

01 | STJ afirma que poluição é crime formal

A 3ª Seção do STJ fixou, em repetitivo (Tema 1.377), que a primeira parte do caput do art. 54 da Lei 9.605/1998 descreve crime formal: não é preciso provar dano efetivo à saúde; basta a potencialidade de dano. A tese vincula juízes e tribunais.

O relator, ministro Joel Ilan Paciornik, ancorou o entendimento nos princípios da prevenção e da precaução: sendo o bem jurídico difuso (meio ambiente equilibrado e saúde pública), o Direito Penal pode atuar antes do resultado lesivo aparecer.

Por isso, o Tribunal também afirmou que não é indispensável perícia técnica, ou seja, qualquer meio de prova idôneo (medições de ruído, autos de infração, relatórios administrativos, testemunhos consistentes) pode bastar.

O caso representativo tratava de poluição sonora: um bar operava acima dos limites regulamentares; o tribunal local tinha exigido prova de dano concreto.

O STJ reverteu e deixou claro que violar padrões de emissão, somado à aptidão lesiva à saúde, satisfaz a tipicidade.

Na prática, o precedente pressiona compliance ambiental em bares, casas de show e indústrias: controle de emissões, políticas internas e gestão de risco passam a ter peso penal e não só reputacional.

Para a defesa, muda a estratégia probatória: discutir idoneidade e cadeia de custódia das medições e relatórios, e a real aptidão de risco, ganha centralidade.

🧐 O que é preciso saber?

  • Tese (Tema 1.377/STJ): o tipo do art. 54, caput (1ª parte), Lei 9.605/1998 é formal; basta potencialidade de dano; perícia não é indispensável (meio idôneo basta).

  • Caso-paradigma: poluição sonora com operação acima dos limites; instância local exigiu dano concreto; STJ reformou.

  • Vinculação: repetitivo vincula instâncias ordinárias (CPC/arts. 927 e 1.040 por analogia). O STJ divulgou a tese em suas páginas de Repetitivos e IACs.

02 | feminicídio é investigado após filho matar a mãe

Um homem de 26 anos foi preso em flagrante em Belo Horizonte após confessar que matou a própria mãe, de 54 anos, com golpes de faca.

Segundo a PM, ele mesmo ligou relatando o crime e mencionou crenças sobre “poupar a dor” e “reencarnação”.

A vítima foi encontrada no quarto, com lesões no tórax e nos braços; familiares citaram agressividade prévia e, no momento da prisão, o suspeito apresentava confusão mental.

A Polícia Civil registrou o caso como feminicídio, e as diligências seguem no inquérito.

O enquadramento inicial por feminicídio decorre do contexto de violência doméstica e familiar, uma das hipóteses de “razões da condição do sexo feminino”.

Desde a Lei 14.994/2024, o feminicídio é crime autônomo (pena de 20 a 40 anos).

Esse registro, porém, não antecipa a sentença: a motivação e as circunstâncias serão testadas pelas provas, e caberá ao MP decidir sobre a denúncia e ao Judiciário o enquadramento definitivo.

No inquérito, a polícia deve apurar dinâmica dos fatos, histórico de violência, laudos (local, necropsia, arma), exames de lesões e oitivas de familiares e vizinhos.

Diante de indícios de alteração psíquica, pode ser instaurado incidente de insanidade mental (art. 149, CPP), com perícia médico-legal para aferir imputabilidade (art. 26 e parágrafo único, CP).

Se inimputável, comprovadas autoria e materialidade, a resposta pode ser medida de segurança (art. 97, CP).

✍🏻 Entendendo melhor…

  • Feminicídio autônomo: art. 121-A, CP (Lei 14.994/2024); razões de condição do sexo feminino incluem violência doméstica.

  • Competência do Júri: crimes dolosos contra a vida (art. 5º, XXXVIII, CF; art. 413, CPP).

  • Cautelares: flagrante pode ser convertido em preventiva (art. 313, I, CPP – pena máxima > 4 anos; art. 312, CPP – fundamentos).

  • Provas: cadeia de custódia (arts. 158-A a 158-F, CPP) para armas, sangue, mídias e vestígios.

  • Saúde mental: incidente (art. 149, CPP); imputável / semi-imputável / inimputável (art. 26, CP); medida de segurança (art. 97, CP).

1️⃣ Quadro rápido: homicídio qualificado × feminicídio autônomo → elementos, penas, causas de aumento.

2️⃣ Checklist do inquérito: preservação da cena → perícias (local, necropsia, arma) → oitivas → histórico de violência → relatório.

3️⃣ Peça prática: minuta de representação por preventiva (arts. 312–313, CPP) ou de incidente de insanidade (art. 149, CPP).

4️⃣ Júri: esboce quesitação em feminicídio (materialidade, autoria, qualificadora), prevendo tese alternativa por semi-imputabilidade.

O código penal do dia…

Vocês já perceberam como o que a gente vê e ouve molda o que sentimos?

Notícias, músicas, podcasts, livros, conversas de corredor… tudo vira lente, tudo vira pulso.

Às vezes achamos que estamos “informados”; na prática, estamos é saturados.

O feed promete mundo em tempo real, mas entrega coração em alerta constante.

E alerta prolongado vira ruído: a cabeça acelera, o sono encurta, a paciência diminui.

Não se trata de viver numa bolha, mas de escolher o que nos atravessa e com que frequência deixamos isso acontecer.

Conteúdo também é dieta: tem coisa que nutre, tem coisa que inflama. Há dias em que precisamos de dados; em outros, de silêncio.

E quase sempre precisamos de arte para lembrar que a vida é maior do que a última notificação.

Pergunte-se, sem culpa: o que me edifica e o que me esgota?

De que vozes eu preciso me aproximar e de quais devo manter distância por um tempo?

Não é fraqueza estabelecer limites; é autocuidado para poder continuar presente, lúcido e generoso.

No fim, curadoria é afeto por si mesmo.

E estabilidade não é ausência de turbulência; é aprender a pousar com segurança, mesmo quando o céu está carregado.

Quatro dicas para levar:

1. Defina janelas de notícias e não consuma antes de dormir.

2. Reveze informação dura com arte e natureza todos os dias.

3. Use listas (trabalho/estudo/lazer) para separar feeds e reduzir gatilhos.

4. Faça um diário de mídia por 7 dias e corte o que drena, dobre o que nutre.

03 | prisão no exterior não segura o relógio da prescrição

O STJ firmou que a prisão cautelar em país estrangeiro, apenas para viabilizar a extradição, não interrompe nem suspende o curso da prescrição no Brasil.

A razão é simples e estritamente legal: essa custódia tem natureza instrumental (garantir o procedimento de entrega), não se confunde com cumprimento de pena sob jurisdição brasileira e as causas de interrupção/suspensão são taxativas.

Logo, não cabe criar novos marcos por analogia.

Na prática, defesas e Ministérios Públicos devem recalcular prazos sem contar a prisão estrangeira voltada à extradição como marco interruptivo.

O entendimento também conversa com outras balizas do Tribunal:

  1. o que está na lei interrompe a prescrição (ex.: acórdão condenatório confirma/majora também interrompe: Tema 1.100);

  2. transação penal não suspende por falta de previsão expressa;

  3. após o trânsito, a prescrição fica suspensa apenas quando o condenado cumpre pena em outro processo no Brasil (art. 116, parágrafo único, CP).

Tudo aponta para legalidade estrita em matéria prescricional.

Mensagem final: cooperação internacional ≠ execução de pena.

Prisão para extradição não mexe no relógio, mas serve como reforço de segurança jurídica e alerta importante para execuções antigas ou com penas curtas.

🌊 Mergulhe no tema…

  • Interrupção (CP, art. 117): rol taxativo; inclui, p.ex., recebimento da denúncia e acórdão condenatório (Tema 1.100/STJ).

  • Suspensão (CP, art. 116, parágrafo único): após o trânsito, não corre a prescrição enquanto o condenado cumpre pena em outro processo no Brasil e não abrange prisão no exterior para extradição.

  • Sem criatividade hermenêutica: transação penal não suspende a prescrição por ausência de previsão legal (STJ).

  • Paralelo no STF: pedido/prisão para extradição não constitui marco interruptivo por legalidade estrita (Ext 1.346/DF, 2ª Turma).

1️⃣ Faça um fluxo da prescrição: antes do trânsito (art. 117) × depois do trânsito (art. 116 p.ú.) → onde pode haver interrupção/suspensão.

2️⃣ Monte um quadro de cooperação: extradição, transferência de executados e carta rogatória e seus efeitos (ou não) na prescrição.

3️⃣ Treine cálculo prescricional em execução penal: simule casos com fuga, prisão no exterior para extradição, cumprimento de outra pena no Brasil e acórdão confirmatório (Tema 1.100).

4️⃣ Elabore uma minuta de pedido de extinção da punibilidade por prescrição executória, demonstrando por que a prisão estrangeira não é marco legal.

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E você encarou mais uma semana de frente. Na próxima edição, seguimos juntos nessa travessia. Até lá, solta sua voz: o que mais te pegou nessa leitura?

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Um abraço de resistência! 🖤